segunda-feira, abril 02, 2012

Muito além do coelhinho…


Esqueça os chocolates e concentre-se no lado espiritual da Páscoa. Em que cada religião acredita?

Era uma vez um menino. Não podendo ser criado pela mãe, foi abandonado em um rio para que fosse encontrado por alguém e, assim, escapasse da morte. Quem o viu, em uma cesta de junco, foi uma princesa, filha do Faraó. A princesa decidiu que queria o menino e o levou para viver em seu reino, como seu filho. Dentro da corte, o menino ganhou nome. Passou a ser chamado de Moisés.

O menino cresceu. Sabendo que não era, de fato, egípcio, o menino quis saber como seu povo – os israelitas – estava. Quando se deparou com um dos seus apanhando de um egípcio, não segurou a raiva. Matou o egípcio, enterrou seu cadáver e, desiludido pensando que poderia estar ajudando escravos israelitas, fugiu. Casou-se com Zípora e passou a cuidar de ovelhas.

O menino envelheceu. Aos 80 anos, se deparou com uma sarça ardente. Deus manifestou-se a Moisés e pediu para que libertasse o povo da escravidão e do sofrimento. Moisés voltou para o Egito e, de lá, conduziu os israelitas por mais 40 anos, pelo deserto. Em busca da terra prometida, Moisés atravessou o Mar Vermelho e recebeu das mãos de Deus os 10 mandamentos.
 

Assim surgiu a Páscoa. Essa passagem pelo deserto, rumo a um futuro desconhecido, mas esperado pela promessa de melhoria de vida deu origem a um costume seguido em todo o mundo, seja por uma questão cultural ou religiosa. Calma, se você pensava que a Páscoa era a festa da ressurreição de Jesus Cristo você não errou, mas isso é história para um pouco mais a frente.

Para compreender melhor o sentido, a festa, a simbologia e o que está por trás da celebração é importante adentrar em universos muito distintos entre si, mas que se compreendem. Em Passo Fundo, as religiões judaica, católica, evangélica, espírita e umbanda explicaram os costumes vividos nessa época do ano.

Judaísmo

Sendo uma das primeiras religiões do mundo e uma das três principais da atualidade (juntamente com o cristianismo e o islamismo), o Judaísmo é a religião que dá origem à Páscoa. A celebração é lembrança e comemoração da passagem dos antepassados pelo deserto, em fuga comandada por Moisés. “O conceito de Páscoa não tem o mesmo sentido no cristianismo e no judaísmo”, ressalta Benami Bacaltchuk, seguidor da doutrina judaica.


Cristianismo x JudaísmoPara esclarecer a relação entre cristianismo e judaísmo: De acordo com a tradição e com a própria Bíblia, para que Moisés conseguisse fugir com o povo hebreu, Deus mandou 10 pragas que assolaram o Egito. Antes da décima praga – a morte de todos os primogênitos do Egito -, porém, a pedido de Deus Moisés instruiu cada família hebraica a sacrificar um cordeiro, e molhar as portas com o sangue do animal. As portas molhadas pelo sangue, não sofreriam da décima praga e seus primogênitos continuariam vivos. Jesus Cristo era seguidor do judaísmo e seus costumes estavam baseados nas leis deixadas por Abraão. Quando Jesus celebrou a Santa Ceia, ele celebrava a Páscoa juntamente com seus discípulos, dando um novo sentido à celebração (que se verá mais adiante). O judaísmo, por sua vez, não aceitou a vinda de Cristo como um novo libertador que veio para a remissão dos pecados da humanidade e a partir da crença em um novo sentido, surge o cristianismo.

“A comemoração é bastante diferente, não é de presentes… Se vai à sinogoga, se reza e existe um jantar onde, junto com as crianças, se fala sobre o significado da comemoração da Páscoa Judaica, lembrando o sofrimento do povo hebreu para se libertar” continua Benami. Nesse período de Páscoa ou Pessach, os judeus têm uma série de costumes, além do lado espiritual. Deve ser feita uma limpeza nas cozinhas para que nenhum alimento considerado pecaminoso – carne de porco, peixe sem escamas e crustáceos – fique dentro da casa. Faz-se um vinho doce, uma espécie de licor e, ainda, toda alimentação é baseada no pão ázimo – uma espécie de bolacha sem fermento, feito de água, farinha e sal. Quanto à ceia, a significação dos alimentos é bastante importante, como explica Benami: “comemos ervas amargas, representando os sofrimentos do povo. Também há ovo, que é a chance de ter uma nova vida. Água com sal representa as lágrimas que o povo hebreu derramou na passagem pelo deserto. Usa-se, também, uma carne pescoço ou um osso, lembrando das dificuldades que existiam. E por último, há o haroise que é uma mistura de maçã, açúcar e canela, para lembrar que nem tudo foi dificuldade”. Essa celebração é tão importante que em Israel o governo fornece farinha e o que mais for preciso aos pobres para que a Pessach seja celebrada por completo. O dinheiro é originado de um imposto que a sociedade paga.

Catolicismo

Era uma vez outro menino: Jesus Cristo. A crença católica se baseia na divindade e na humanidade de Jesus: ao mesmo tempo em que é filho de Deus e, portanto, portador de divindade, Jesus se faz humano e vive entre o povo. Além da Bíblia Sagrada – antigo e novo testamento -, o catolicismo é fundamentado por preceitos advindos do próprio Vaticano, através do Papa – sucessor de são Pedro. É uma das religiões com maior número de fiéis em todo o mundo e, no Brasil, é a de maior abrangência. Jesus Cristo nasceu em uma família que seguia o Judaísmo. Aos 30 anos, começou sua pregação entre o povo e, desde então, trouxe novos ensinamentos baseados no amor e não mais na teoria do “aqui se faz, aqui se paga”. Conquistou muitos seguidores e muitos inimigos em apenas três anos de vida pública. “A ação salvadora se dá através de Jesus. Ele, com seus ensinamentos, vem propor uma vida nova, uma transformação nas atitudes de cada um”, destaca o Padre João Claudio Gossler, pertencente à Paróquia Nossa Senhora de Fátima. O novo sentido da Páscoa, instituído pela vida de Jesus, tem por objetivo celebrar uma mudança de vida, a novidade, a instituição de um novo modo de pensar e uma renovação de sentimentos. A Igreja Católica, explica o padre, tem suas celebrações dividas por tempos litúrgicos – espaços de tempo onde as missas tem temática especial a fim de celebrar motivos diferentes – e a festa da Páscoa tem seu início no Tempo da Quaresma – 40 dias que antecedem o domingo pascal, em memória aos 40 dias que Jesus Cristo passou no deserto em jejum. O Tempo Pascal continua com a Semana Santa – que inicia no Domingo de Ramos, celebração que relembra o momento em que Jesus foi aclamado como rei pelo povo judeu, prossegue com a Quinta-Feira Santa, quando aconteceu a Última Ceia, “instituição da Eucaristia e do Sacerdócio. Diante do que sabia que iria passar, Jesus realiza um último momento com sues discípulos e se dá sacrifício, a fim de redimir todo e qualquer pecado. E, ainda, ao mesmo tempo em que celebra a Páscoa com os discípulos, Ele já institui o novo sentido da Festa, institui a Páscoa cristã”, esclarece. Em seguida, a Igreja realiza a celebração da Sexta-Feira Santa, onde há adoração de Jesus Cristo morto. “No Sábado de Aleluia, no entanto, nos preparamos para a chegada daquele que nos salvou. O Pai não permite que a morte seja a última palavra e, junto com Jesus Cristo, todos são resgatados da morte e levados a uma vida plena”, destaca Padre João. No Domingo de Páscoa, a Igreja realiza a chamada Liturgia da Ressurreição, como forma de lembrar o momento em que Jesus se apresenta ressuscitado aos discípulos e ao próprio povo. Esta, como destaca o padre, é a maior festa da Igreja católica: “É dessa e nessa celebração que provém toda a história de salvação”. A Festa da Páscoa celebrada pela Igreja Católica é, portanto, a festa da ressurreição e, ainda, “a festa de uma nova compreensão de Deus. Um Deus que ao invés de pedir sacrifícios, se dá em sacrifício e espera apenas uma resposta ao pedido de adesão ao seu projeto. São as atitudes que determinam ou não a nossa salvação. O sacrifício já foi feito”, finaliza.

Religião Evangélica

Baseada unicamente na Bíblia Sagrada, a Igreja Evangélica vivencia a Páscoa a fim de relembrar o sacrifício vivido por Jesus Cristo e a sua ressurreição. Do mesmo modo que o catolicismo, os evangélicos seguem uma ramificação cristã, centrada na vida, morte e ressurreição de Cristo. “Professamos a mesma fé”, sintetiza o Pastor César Variza, da Comunidade Evangélica Bom Pastor. Para os evangélicos, a festa da Páscoa tem sua origem na própria história do judaísmo e, com a vinda de Jesus Cristo, assumindo um novo significado. “Jesus Cristo, que era judeu, veio para trazer um novo sentido à festa da Páscoa. Instituiu a Santa Ceia e se fez cordeiro, em alusão à última praga contra o Egito, relatada no antigo Testamento, morrendo na cruz e aí, a Páscoa passa a ser uma festa cristã e não judaica”, ressalta o Pastor. Para os evangélicos, bem como para os católicos, a Páscoa é o centro de toda a crença e a ressurreição de Cristo é o que diferencia o cristianismo de qualquer outra religião ou seita. As celebrações realizadas pela Comunidade Evangélica, atualmente, giram em torno da lembrança de todo o episódio de morte e ressurreição de Cristo. Entre as cerimônias está a Santa Ceia, que consiste em uma celebração mensal onde pão e suco de uva são servidos aos fiéis, representando o corpo e o sangue de Jesus. A diferença desta celebração para a celebração do dia da Páscoa é no teor do sermão proferido pelo Pastor que, neste dia, foca o lado histórico da vida de Jesus, como ressalta o Pastor Variza: “temos por objetivo relembrar o plano de Deus de salvação, através de Jesus Cristo. Toda Páscoa, o evangélico relembra isso através da Santa Ceia”. Independente da forma como a cerimônia é realizada, “todos aqueles que crêem na palavra de Deus, vão comemorar a Páscoa”, finaliza o Pastor.



Espiritismo

O espiritismo tem por base a evocação de espíritos para a realização da caridade e do bem. Segue os preceitos desenvolvidos por Allan Kardeck, codificador do espiritismo. Seu objetivo, enquanto religião é o aperfeiçoamento do homem através de mensagens enviadas pelo que seriam “seres superiores”. Segundo Gleci Oliveira, uma das fundadoras do Centro Espírita Pedro Cogo, não há uma celebração pascal, pois não se acredita na ressurreição: “nossa crença é na reencarnação do espírito, sabemos que a ressurreição – a volta de um corpo – é impossível”. Apesar de não haver nenhum tipo de menção especial à data, o espiritismo respeita qualquer tipo de crença, não proibindo os adeptos de celebrar ou comemorar a Páscoa. “Não há um dia específico. Todos os dias há o respeito ao próximo e o amor de Deus. Todos os dias procuramos exemplificar o que Jesus nos deixou”, ressalta Gleci.

Umbanda

Única religião originada, de fato, dentro do Brasil a Umbanda nasce da união do catolicismo popular, da religiosidade africana e da religiosidade indígena e se caracteriza pela facilidade de adequação à diferentes crenças. Rigoberto Fransceschi, Babalorixá – espécie de sacerdote ou líder religioso – do Centro Espiritualista de Umbanda Guerreiros da Luz, destaca que a religião é a única literalmente brasileira: “Outras religiões nos foram impostas. O cristianismo não nasceu aqui. A Umbanda é uma coisa nossa, particular do brasileiro”. A filosofia da religião é embasada na fraternidade, na caridade e no respeito ao próximo. Admite a existência de um Deus, cultua divindades através dos Orixás, ou seja, divindades ligadas à forças da natureza, e reverencia espíritos chamados Guias - espíritos que atuam em conjunto com Orixás e manifestam-se através da mediunidade e incorporação. “Em cada canto do país, a Umbanda assimila a crença do povo. Não somos rígidos. Independendo da cultura, continuamos fazendo o nosso culto. Se trabalha com espíritos para fazer caridade. Em qualquer lugar que você chegar e puder tomar um passe com o Preto Velho ou com o Caboclo, é Umbanda”, explica Rigoberto. Quando perguntado sobre a Páscoa, o Babalorixá explica que não existe nenhuma celebração dentro da Umbanda: “Não temos essa questão… A Páscoa é a passagem do povo judeu pelo Egito. O Cristianismo anexou isso aos seus calendários, da mesma forma que o Judaísmo. Dentro da umbanda não serve como fundamento”. Apesar de não existir nenhum tipo de celebração da Páscoa, a Umbanda respeita os 40 dias que representam a Quaresma, dentro do cristianismo, realizando, em boa parte das casas, Sessões de Exú para proteção de espíritos maus que se acredita estarem “soltos” nessa época. Para a Umbanda, a ressurreição de Cristo também não assume o mesmo significado do Cristianismo.


Fonte -http://www.upf.br/nexjor/?p=11366
 Autor: Sammara G. Garbelotto
É acadêmica do V nível do curso de Jornalismo. Estagiária de Comunicação do Colégio Bom Conselho. Estagiária do Núcleo Experimental de Jornalismo da Agência de Comunicação da UPF.

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